segunda-feira, 6 de março de 2017

À meia luz – Por Maria Christina

Maria Christina: Participante do Minicurso de crítica teatral “O que pode uma crítica teatral?” 
O texto sobre o qual se baseou a atuação dos atores de O Conto das Duas Ilhas, e a ideia que inspirou o cenário, as figuras e os movimentos das marionetes, foram soprados pelas asas de pássaros migrantes em voo de retorno ao lar no ouvido de um poeta que os reproduziu em versos à sua amada, que cantava enquanto costurava colchas coloridas e circulares impregnando-as de alegria, e vendidas a viajantes estrangeiros se espalharam pelo mundo reconhecidas como mandalas, chegando a importantes sítios de contemplação, tornando-se motivo de intensos trabalhos literários que decodificaram seus traços e linhas, dando-lhes outras formas, permitindo-lhes, assim, chegarem a mais e mais lugares.
Essa inspiração viajou durante milênios, atravessou o mundo várias vezes, sendo depositada suavemente em mãos que a teceram em finíssimas linhas revelando sua face e voz. Generosamente nos foi ofertado sob a forma de peça teatral, permitindo que céu e terra dialogassem um tema que nos convida a uma viagem não só pela imaginação, mas pelo interior de sonhos que nascem da poesia.
O que se vê no espetáculo, todo ele à meia luz, são os ecos daquele sussurro, travestidos de misteriosos olhares que se movem lentamente no presente, dedilhando as cordas do tempo a nos lembrar da tênue linha que nos separa do infinito.
Há algo de tímido naqueles atores, um certo ar pueril que acentua a nota delicada dos movimentos, totalmente envolvidos pela trilha repleta de poesia impressa em cada nota musical e no timbre de voz do cantor. Todos eles por certo comungam da reflexão de Horácio sobre o que está por trás das ondas e do horizonte – eles também perscrutam o exíguo ambiente antes do passo seguinte. A incerteza é a única certeza, força motriz e incentivo, e o que alimenta o desejo.
Disse Gandhi, certa vez, sobre o caminho para a paz: "a paz é o caminho". Das tantas matérias que a paz é feita, certamente a arte contribui com elementos fundamentais a compor essa argamassa que não cessa de se reinventar a cada tempo, a cada cena e cada som, base necessária a manter a esperança dos que amam, apesar dos tempos difíceis, em que cobiça e ego habitam tantos corações. Mas a arte resiste – e nós, com ela.
Maria Christina
6 de Março de 2017
Ficha Técnica
Dramaturgia:
San Rodrigues
Marionetistas:
San Rodrigues e Nina Brito
Construção de Marionetes:
San Rodrigues
Cenografia:
Nina Brito
Iluminação Cênica:
Marckson de Moraes
Trilha Sonora Original:
Renato Torres
Canções:
Marília, Além e O Primeiro Veleiro (San Rodrigues)
Vozes dos Marionetes:
Renato Torres (Carapirá), San Rodrigues (Horácio) e Nina Brito(Marília)
Assistente de Atelier:
Glaucia de Jesus
Adereços de cena (Sol e Lua):
Luciana do Carmo
Confecção de Figurino:
Anne Moraes
Equipe de Captura e Animação (Stop Motion):
San Rodrigues, Nina Brito, Marckson de Moraes e Gabriel Angelo
Registro e Edição de Vídeos e Imagens:
Alexandre Yuri
Assessoria de Imprensa:
Yorranna Oliveira
Produção Executiva:
Patrícia Ventura
“O Conto das Duas Ilhas”, do Projeto Camapu, ganhou o Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz 2015


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