Silvia Teixeira: Atriz e Graduanda
de Licenciatura em teatro – UFPA.
No domingo, na Estação
das Docas, instituição da Secretaria de Cultura do Estado do Pará, presenciei simultaneamente
dois espetáculos de teatro, um que denominava-se por teatro com bonecos e o
outro de teatro de bonecos: o primeiro
era o do Grupo In Bust - Teatro com Bonecos, e o segundo o qual batizei de Grupo Manipão Teatro de Bonecos, o qual
merece meu destaque, pois conduziu sua marionete pelos fios, suas técnicas de
manipulação foram tão mal executadas, contribuindo para o primeiro, que quase
por um“ fio” de ser sua pior atuação.
Começo este parágrafo tecendo a respeito ao nome
dado ao espetáculo com bonecos “Fio de Pão” que por alguns segundos pensei que
o fio dado ao espetáculo justificaria a técnica de manipulação de boneco de
marionete (bonecos grandes controlados por fio em uma cruzeta), mas não era,
por incrível que pareça o nome surgiu de um fato curioso durante uma
apresentação. Um cachorro raquítico fez-se presente durante o espetáculo, então
um dos atores deu pão para o pobre animal comer, logo o batizaram de “Fio de
Pão”. E para recordar a presença do bicho, os integrantes acrescentam um
cachorro de boneco o qual viria ser o animal de estimação do garoto Girino que
também o batizou de “Fio de pão”.
Fio
de pão - A Lenda da Cobra Norato, narra a lida de uma
família nordestina no Pará, que saem de feira em feira apresentando-se com seu
teatro de bonecos com a narrativa da Lenda da Cobra Norato, onde o pai, deficiente
visual, toca a viola, a mãe conta a lenda e o filho junto a mãe manipulam os
bonecos e os objetos. O grupo apropria-se de uma arte híbrida entre o teatro,
teatro de bonecos, contação de história e música. Os bonecos não são
protagonistas dessa narrativa e muito menos os atores, eles compartilham do
mesmo espaço, ora os manipuladores usam a neutralidade no manuseio dos mesmos,
ora o boneco é uma extensão do próprio corpo do ator e outrora o ator apresenta
a sua própria personagem no boneco em um jogo de co-presença (CAVALCANTE, 2008,
P.40).
O grupo quebra as regras do jogo do teatro de
bonecos clássicos, por isso a In Bust entra na categoria do Teatro
com Bonecos, reafirmando esse conceito Henrique Sitchin, coordenador de Centro
de Estudos e Práticas do Teatro de Animação de São Paulo, tecendo um comentário
em seu livro “As possibilidades do Novo Teatro de Animação”. Geralmente, os
grupos de teatro de bonecos clássicos utilizam os bonecos homogêneos em suas
poéticas, a In bust faz a construção poética heterogênea, mesclando vários
modelos, como o de vara, bonecos de miritis, fantoches e manés-côcos. E o modelo
que fez meus olhos brilharem, são os que representavam o casal ao darem um
salto no tempo e relatarem o momento que conheceram-se; os bonecos eram de vara,
com cintura de cuia, utensílio de grande expressão na culinária paraense.
Um fato muito importante a ressaltar é a didática do
ator Aníbal Pacha que atuara como Girino: ao apresentar as cobras, antes de dar
vida as mesmas, mostra para as crianças que as cobras não eram de verdade e sim
bonecos, quebrando o ilusionismo para retrair o medo que as mesmas poderiam ter
ao longo da apresentação.
Destaquei anteriormente a segunda categoria de
bonecos apresentada, por serem puxados por fios e conduzidos por um manipulador
– o qual domino de Governo. No espetáculo havia personagens cegos, mudos e
surdos, e como é desgastante tal encenação; pois sabemos que essa técnica de
manipulação é milenar. O espetáculo apresentado pela Cia do Governo foi a falta
de estrutura necessária para receber artistas e público. O grupo In
Bust apresentou-se em uma passarela de grande fluxo de pessoas, a
estrutura do som, não havia qualidade, aliás, não tinha um retorno para que o
público entendesse a letra cantada pela personagem Jurandir, a maioria das
pessoas assistiram em pé pela escassez de cadeiras, e como o espaço não é
apropriado, não havia uma iluminação que valorizasse a entrada dos bonecos em
cena.
É até louvável a agenda da Estação das Docas abrir
espaço para o compartilhamento do teatro com a população, porém é lamentável estabelecer
que somente migalha de pão é necessário. E lamentável ainda, em ter um lugar
que abriga diversos espaços para o alimento do corpo e não oferecer um espaço
mínimo e adequado para o alimento das artes.
Diante de todos esses fatos o espetáculo Fio de Pão - a Lenda da Cobra Norato o
qual já venho acompanhando há quinze anos, só não abateu-se pelo profissionalismo
e o compromisso que a In Bust tem de levar o teatro para o povo, e acreditar
que a arte é um direito de todo o ser humano.
10.06.2015
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