Louise Bogéa: Servidora pública federal do Museu da UFPA.
A releitura das fábulas
encantadas da Disney feita pelo espetáculo “Encantados S.A” teve seus momentos,
ontem, no teatro Cláudio Barradas. O que se iniciou até um pouco sem graça foi,
aos poucos, ganhando vida, juntamente com o garoto central do enredo, o Noque,
ou melhor, o Pinóquio.
Inspirado na famosa
fábula da personagem, o enredo nasce a partir da solidão do garoto – com apenas
seu brinquedo preferido como amigo – até quando, ao perceber acontecimentos
suspeitos e sobrenaturais, encontra-se com uma organização secreta que é nada
menos que a mistura das principais personagens de outras fábulas da Disney: as
princesas, os príncipes, os vilões, as fadas e outros chamados ridiculamente de
“restantes”: todos constituem a intitulada “OSSEAPEPROFOSOI”. A sátira é,
assim, realizada, principalmente, com a entrada de um desses grupos no palco. A
meu ver, o seu ápice fora durante a reunião da organização, quando todas as
personagens estavam juntas.
Relembro-me agora que no
original “As aventuras de Pinóquio” de Carlo Collodi (1881) – assim como na
versão adaptada da Disney –, a personagem principal era o boneco de madeira,
este transformado em garoto, após adquirir sentimentos e experiências de vida.
Há, também, releituras da obra original onde a reflexão se dá sobre as pessoas
de carne e osso virarem bonecos – marionetes – de algum sistema. No espetáculo,
porém, a revelação que o garoto era o “Pinóquio” e o seu brinquedo, o “grilo
falante”, deu-se apenas ao final, por meio do aparecimento do nariz grande
(característica carregada de simbologia no nosso imaginário) e das vestes do
grilo. Inicialmente, o garoto fora apresentado apenas como uma criança mimada e
solitária, para depois ser considerada como especial pelos membros da
organização dos encantados.
Ressalta-se que nem o
drama, nem tampouco as lições de vida do original foram enfatizadas durante a
peça, mas sim, a pura sátira, para entreter o público. A comédia era, por
vezes, relacionada com o enredo dos originais; outras vezes, com fatos cômicos
mais atuais; ou ainda, com a própria estupidez das personagens interpretadas. A
atenção até fora roubada de Noque e do seu amigo, para focar na sátira entre os
membros da organização secreta, voltando, apenas ao final do espetáculo, o foco
no garoto – momento de sua revelação como Pinóquio. Percebe-se, aqui, que a
intenção fora a de mostrar o amadurecimento de Noque, ao encontrar o seu amor,
deixando o seu amigo imaginário, para o encerramento da peça.
Portanto, a trama
repassa as lições de vida propostas no conto de fadas, dando ênfase na comédia.
Vale mencionar que o espetáculo parecia ser voltado ao público infantil, mas
ele acabou englobando uma gama maior, sendo capaz de atingir todas as idades:
principalmente aqueles que sejam especiais, como o Noque, e consigam ver um
mundo secreto, ou seja, mais além do desencantado mundo real que vivemos – ou
uma mistura deles.
Vale mencionar algumas
falhas pertinentes, ainda que alheias ao espetáculo: o horário prejudicou um
pouco a apresentação, cansando o público; e limitações quanto à estrutura do teatro
– cadeiras um tanto desconfortáveis e o palco demasiadamente baixo, impedindo
sua observação plena pelos espectadores.
Os artistas se
mostraram talentosos e houve certa criatividade na narrativa, em sua forma de
transmitir o humor – inclusive na execução de alguns pequenos improvisos pelas
personagens. Nota-se que o seu trabalho é realizado com comprometimento e certo
entrosamento entre a equipe dos artistas. O resultado foi o público presente sendo
notadamente entretido. Mesmo os mais preconceituosos –
houve a interpretação de personagens femininas por homens e vice-versa no
elenco – desatinaram-se a rir das cenas apresentadas.
Destaca-se a tentativa
de transpor o encantamento à nossa realidade e, ao mesmo tempo, interagir com
os presentes, ao, dada por encerrada a peça, esconder doces embaixo de duas
cadeiras da plateia, para presentear os “especiais”. Ainda durante a despedida,
pediu-se, também, para falarmos em uníssono a palavra “Xuxa”, movimentando os braços em forma de um “X”,
conforme era feito pelos membros da organização secreta do enredo, para, enfim,
tirarmos uma fotografia todos juntos.
Em uma última análise,
apesar dos esforços, preciso dizer que o entretenimento se caracterizou como
algo momentâneo e efêmero: eu gostei da peça e achei-a divertida, mas não a
veria novamente. Acredito que o objetivo de uma arte, esta seja qual for, é o
de se tornar eterna – ou pelo menos ter esta visão –, ao se mostrar ao mundo. Portanto,
o espetáculo mereceu as palmas, mas, assim como tantos outros, acabou-se ali,
juntamente com elas.
A falha, talvez,
centrou-se na própria escolha da essência do humor da obra, ao ridicularizar
algo eterno, ou que sobreviva após tantas gerações. Isto não significa criticar
a sátira, pois esta pode ser interessante – se objetivar uma intervenção e/ ou
mudança em algum contexto–, mas sim, a sátira sem sentido, ou apenas pelo
simples entretenimento por meio do ridículo. Arrisco dizer que tal finalidade
seja da grande maioria das artes cômicas atualmente, não apenas do espetáculo
“Encantados S.A”.
06.06.2015
Fui no teatro, vi a peça e li a crítica e concordo com o que foi escrito pela autora Louise Bogéa. Eles quiseram ridicularizar as histórias que existem...tais como os principes e as princesas e até mesmo a história do pinóquio...
ResponderExcluir