segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Sinestesia Pós Dramática – Por Raphael Andrade.

Autor: Raphael Andrade- Ator; Graduando em Licenciatura em Teatro- UFPA.
Olho para meu relógio de pulso são 21h06 min. Ligo o notebook, reflito sobre como começarei a escrever a crítica para a TRIBUNA DO CRETINO. Penso: será que alguém vai ler? O Prof. Edson Fernando vai pedir para eu mudar? que enfadonho! (procurei no Google o sinônimo de chato) O que pretendo indagar? O que o espetáculo me transmitiu? Desisto... Ouço Charles Gounod no You Tube. Sento na cama; abro o programa do World; dedilho sobre o teclado idealizado por Qwerty; começo a pensar no título. Ixi, nada vem em mente... SENSORIAL, Raphael. Relativo a sensório! É isso! Vou começar... está chato? Não ligo! Ligo sim!
Sábado, 26 de Novembro – Em passos largos, com o olhar atento ao meu redor, passo por um túnel de luzes natalinas abaixo das mangueiras suntuosas da Praça da República. Espantosamente não faz calor em Belém. Entre olhares, buzinas de veículos, burburinhos e cheiro de pipoca, caminho ao lugar que será apresentado o espetáculo Cerimônia de Olhares, ICA – Instituto de Ciências da Arte, ao lado do teatro Waldemar Henrique e defronte ao suntuoso Teatro da Paz. Reflito: por qual motivo este é o lugar escolhido, haja vista que, este não é um teatro? Bom, não faz parte do meu metiê.
Adentro o referido local, pego meu ingresso, sento ao lado de desconhecidos, cumprimento-os com boa noite. Espero...
Por que comecei a escrever isto? Ah, claro, porque já vi o espetáculo e sei que o mote do mesmo é: Teatro de percepções! Por este motivo, o prólogo já começa neste intuito. Nos 10 minutos do descer do coletivo até me alocar, quantas percepções minhas retinas, olfato e audição puderam, neste pouco tempo, ficar gravados em minha memória?
SENSORIAL – Se eu não estivesse pensando sobre tudo o que ocorreu antes do ato teatral me indagar com essa palavra destacada acima, tenho convicção, que todas essas ações até chegar ao local do espetáculo passariam despercebidas. Assim como deixamos de perceber, nestes tempos atribulados, o que se passa à nossa volta. Bom, este espetáculo gerou de certa forma, o incremento de minha sensibilidade imagética.
Passaram-se 40 minutos de espera, o diretor do espetáculo, Miguel Santa Brígida, nos cumprimenta e fala brevemente sobre o espetáculo comemorativo dos 25 anos da Companhia de Atores Contemporâneos, da qual é fundador, também cognominado “Teatro do Movimento” – O espetáculo faz uma alusão a fragmentos de peças produzidas nestes referidos anos.
Adentramos o local escuro da encenação, somos no máximo 30 espectadores. O espaço cênico de arena não comporta muitos lugares. Fachos de luzes de lanternas perpassam pelo recinto, apenas sapatos pelo chão negro e um piano compõe a visualidade. Atrás das enormes janelas da grande sala, sombras dos atuantes intensificam nossas expectativas.
Abrem-se as portas, as iluminações compostas apenas de lanternas fazem um bailar de luzes sobre as pernas dos atuantes como se fosse uma dança – Começa uma espécie de agitação expressionista, ao qual me remeteu ao desenvolvimento de dança do teatrólogo Rudolf Laban (1879-1958), ao qual o objetivo principal reside na expressão das emoções baseado em quatro fatores: espaço, peso, tempo e fluxo. Nesta perspectiva, os atores/performers estabelecem com elegância e instintiva gestualidade, um aprazível, enérgico e envolvente jogo dança/teatro, impulsionando, desta forma, uma trajetória de cerimônia de olhares entre o sensorial onírico e a percepção imagético-sonora dos elementos técnicos, da metáfora que nos é apresentada; completado pela sintonia da sonorização (ao vivo ou digitais), gestos, dança, elementos cênicos e a ruptura do textocentrismo ou dramatis personae, características do Teatro pós dramático denominado pelo professor alemão Hans-Thies Lehmann (1944) ao qual tenta reconstruir um diálogo com o espectador:
Esta nova forma teatral não procura suscitar a adesão do espectador, mas provocar sua percepção ou emoção significativa. Os aspectos fragmentários destes textos, ou destas montagens, permeiam uma reescritura cênica que englobam os aspectos textuais, cenográficos e os problemas que são propostos por um jogo não necessariamente psicológico.
Nestes fragmentos de cenas que não têm, ao menos para mim, uma linearidade, permanecem somente as sensações (que me foram intrínsecas): temor; prazer; dor; morte; estupro; confiança; desconfiança; repúdio; loucura, liberdade; nascimento dente outros – Nesta sinestesia, novos olhares são possíveis no teatro contemporâneo. Tenho a sensação que somos parte inerente da encenação, não necessariamente porque os performers falam diretamente com o público, mas sim, por estarmos ligados pelas vivências que nos transmitem esta teatralidade.
Para quem pretende ver Cerimônia de Olhares, sairá com a certeza que o teatro não necessita necessariamente do “drama puro” para passar algo para quem o vê. Pois, este espetáculo é uma espécie de simbiose que singulariza a sua envolvência com a contemporaneidade, anestesiando quem o presencia.
São 22h13 min. Penso nos três períodos de tempo existentes: o tempo passado, o tempo presente, e o tempo futuro. Vem à mente a música Oração ao tempo e, com esta canção, agradeço pelo belo espetáculo e dou votos de mais 7x25 anos de “Teatro do Movimento”.
[...] Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Tempo, tempo, tempo, tempo
Entro num acordo contigo
Tempo, tempo, tempo, tempo

[...] Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo, tempo, tempo, tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo, tempo, tempo, tempo

[...] Portanto, peço-te aquilo
E te ofereço elogios
Tempo, tempo, tempo, tempo
Nas rimas do meu estilo
Tempo, tempo, tempo, tempo

          
          22h26min. Tirem suas percepções sobre o espetáculo.
Continuo com a sensibilidade aflorada.

Ficha Técnica
Atuantes:
Alessandra Pinheiro, Aninha Moraes, Cei Mello, Claudia Messeder, Edilene Rosa, Hudson dos Passos, Jaime Barradas, Marcelo Nunes, Sônia Santos,.
Participações especiais das bailarinas:
Ana Flávia Mendes Sapucahy, Eleonora Leal e Waldete Brito.
Pianista Convidada:
Mauri Ohana.
Equipe Técnica:
Criação roteiro:
Miguel Santa Brígida.
Assistente de direção:
Jaime Barradas e Patrícia Passos
Pesquisa musical:
Rogers Paes, Miguel Santa Brígida e Marcio Souza.
Consultoria Artística e Cenografia
Aníbal Pacha.
Figurinos
 Direção e Elenco.
Desenhos de Luz e operação
Direção e Elenco.
Operador de Som
Marcio Souza
Costureira
Nadja Melo
Foto Cartaz
Guy Veloso
Programação visual
Raphael Andrade
Apoio Técnico e afetivo
Vitor Rezende, Lenni Torres e Vivi Torres.
Produção e divulgação
Patrícia Passos.
Direção Geral

Miguel Santa Brígida.

3 comentários:

  1. Obrigada Raphael Andrade pela sensibilidade,verdade,percepção e inteligência de suas palavras a respeito do Espetáculo "Cerimónias de Olhares" que celebra os 25 anos da Cia.Atores Contemporâneos.
    Cláudia Messeder

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  2. Obrigada Raphael Andrade pela sensibilidade,verdade,percepção e inteligência de suas palavras a respeito do Espetáculo "Cerimónias de Olhares" que celebra os 25 anos da Cia.Atores Contemporâneos.
    Cláudia Messeder

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