Autor:
Raphael Andrade- Ator; Graduando em licenciatura em Teatro- UFPA.
Belém de Tebas ou do
Pará, 04 de Dezembro. Domingo não é feira porque é santo. Acorda, tenta fazer
alguma coisa útil. Desiste. Acende um incenso de citronela, gira o incenso na
mandala, convoca os santos para pedir iluminação para a semana, faz a oração de
Oyá – sincretizada Bárbara (é dia dela) para manter o ideal vivo, pinga
essência de Jasmin no caboclo de pele clara. A mãe ainda diz que é Católico
Apostólico Romano. Acha que é idiossincrático por causa da mulher, mas lembra
que já nasceu assim por causa da cor da toalha e da coca-cola...
Às 17h10, percorre o
caminho de Tebas. Suas ruas são sujas e pichadas. Dobrando o mercado de ferro,
vêem-se cidadãos tebanos trabalhando em pleno domingo – vendem peixes, aromas e
variadas iguarias. Sente o odor das águas calmas próxima do palácio. Retira o
ingresso, é grátis! Pensa se não o fosse se estaria lotado. A fila enorme se
entende ao redor do alvo palácio. Chegou cedo para pegar um bom lugar, mas
dentro da corte duas moçonas fortes já estão acomodadas na primeira fila,
enquanto fora, idosos e uma mãe com bebê de colo ficam em pé. Não é de se
admirar! Em Tebas têm disso, os “não letrados” sempre serão os últimos.
Acomoda-se na segunda fileira e observa os detalhes do suntuoso palácio. Vai
assistir aquilo que já presenciou na primeira temporada e que meio mundo
comentou. (O disseram que nada mudou). Mas sabe que a linha tênue da verdade é
a mentira.
Édipo Rei é o nome da
peça trágica. Nos primeiros minutos rola um arrepio. Parece uma espécie de
canto
gregoriano que tanto
admira. Lembra que não sentia esse arrepio faz tempo. Até achava que o sistema
nervoso não respondia mais ao estímulo da amante amada: música. Acha belo o
bailar das personas numa espécie de transe até a cópula...
A tragédia prossegue e
começa a se emocionar. Mas não chora. Pausa. Lembra da primeira vez (de quê,
não interessa) Arregala os olhos, Pensa em Freud, Foucault e suas teorias sobre
a homossexualidade. A cena é violentamente encantadora. Lembra que é humano.
Esquece que é arrogante. Lembra que não atua há muito tempo. O suor cai na
boca. Sente o gosto do mar. Mare Nostrum.
Não tem nenhum senso
crítico, é só emoção (inverdade)! Acha à linha contínua impecável – Aristóteles
(384 a.C-322 a.C.) ficaria imbuído de encanto. Ama as quatro mãos: as que
batucam e as que tocam instrumento de teclas. Vibra com o figurino e com a
beleza da iluminação, mas percebe que o rei não tem trono. Lembra-se o que a
poetisa se referira: "Que importa o sentido que tudo vibra?". Admira
a intensidade diferente que vê e a sutileza do movimento ou seu antônimo. Acha
graça das “mãos de monstro” (energia concentrada nas mãos dos atuantes). O Rei
tebano parece o substantivo abstrato – RAIVA (Imagina: Lá vai uma raiva
passando...). Grita, vomita o texto. Ainda assim, se agiganta no palco. Outros,
porém, passam despercebidos. Reflete: o que importa diante de tamanha
espetacularidade? Absorve tudo na retina.
Imagina Sófocles (498
a.C.–406 a.C.) apavorando os gregos de outrora com o maior dos terrores que os
poderia assolar: parricídio e o incesto. Não o inveja, pois sabe que na sua rua
ainda é Tebas. Temos semelhanças de todos os gostos: parricídio, vingança,
discriminação, calamidades em geral e, para variar, o rei que manda no palácio
tem trono, súditos e foi reeleito. E se faz de cego para inúmeras situações.
Que os deuses o (nos) perdoe(m)! Nesta péssima perspectiva, adoraria ser
Tirésias para afrontá-lo.
Vê a capa vermelha da
morte. Lembra da importância do vermelho. Sabe que o céu parece azul, mas o
sangue parece vermelho. Suja de sangue as emoções. Poema sujo. Tenta
estabelecer a conexão concreta nas curvas de Landi (1713-1791). Lembra de
guardar o poema de Cícero (106 a.C.-43 a.C.). Faz analogia. Lembra dos
ex-amores, dos amigos, dos momentos, dos inimigos, dos ódios, lembra daquela
sensação gostosa. Lembra de lembrar. Percebe que o mundo precisa de arte! ARTE!
ARTE! ARTE – AR, TER.
Lembra: “Nenhuma
criatura humana pode fugir do seu destino”.
No fim, aplaude de pé!
Quer abraçar os diretores e os atuantes. Mas, morre de medo. Para ele, são
todos uma espécie de Górgona. O medo maior é de virar pedra. Lembra do poema de
Gullar (1930-2016), que partiu hoje. Acha interessante ser pedra. Esquece tudo.
Escreve um texto para lembrar.
Agradece, lembra a
importância de criticar e poematizar.
Raphael
Andrade
05
de Dezembro de 2016
Ficha
Técnica:
Atuação
Aj Takashi, Alana Lima, Anderson
Monteiro, Bárbara Monteiro, Bruno Silva Ferreira, Dayci Oliveira, Dél Ventura,
Eliane Flexa, Felipe Almeida, João Melo,
Lennon Bendelak, Marcos Bahia,
Marcela Tocantins, Noah de Moraes, Paulo César Jr., Paulo Jaime, Rafella
Cândido, Rhero Lopes, Siane Morais e Ysamy Charchar
Participação
especial das crianças
Kaylanne Ribeiro e Lívia Mesquita
Direção/encenação
Denis Bezerra, Karine Jansen e
Renan Delmontt.
Figurino
Marcelle Engelke, Christie
Monteiro, Jean Negrão, Mayla Serrão, Alessandra Marques, Ana Luz, Lúcia
Almeida, Mayla Serrão e Nazaré Galvão.
Maquiagem
Jean Negrão e Rafael Ventura.
Coordenação
de Figurino
Ézia Neves
Cenografia
Ana Juliana Oliveira, Giovane
Barbosa, Leandro Trindade e Yan Almeida.
Coordenação
de Cenografia
Adriana Cruz.
Iluminação
Giovane Barbosa.
Coordenação
de Iluminação
Tarik Coelho.
Músicos
Moisés Batista.
Preparação
Vocal
Lúcia Uchôa.
Arte
Gráfica
Raphael Andrade.
Apoio
Paulo de Tarso, Sônia Miranda e
Regiane Maciel.
Nenhum comentário:
Postar um comentário