Autor: Raphael Andrade- Ator; Graduando em Licenciatura em
Teatro- UFPA.
Olho para meu relógio de pulso são 21h06 min. Ligo o
notebook, reflito sobre como começarei a escrever a crítica para a TRIBUNA DO
CRETINO. Penso: será que alguém vai ler? O Prof. Edson Fernando vai pedir para
eu mudar? que enfadonho! (procurei no Google o sinônimo de chato) O que
pretendo indagar? O que o espetáculo me transmitiu? Desisto... Ouço Charles
Gounod no You Tube. Sento na cama; abro o programa do World; dedilho sobre o
teclado idealizado por Qwerty; começo a pensar no título. Ixi, nada vem em mente...
SENSORIAL, Raphael. Relativo a sensório! É isso! Vou começar... está chato? Não
ligo! Ligo sim!
Sábado, 26 de Novembro –
Em passos largos, com o olhar atento ao meu redor, passo por um túnel de luzes
natalinas abaixo das mangueiras suntuosas da Praça da República. Espantosamente
não faz calor em Belém. Entre olhares, buzinas de veículos, burburinhos e
cheiro de pipoca, caminho ao lugar que será apresentado o espetáculo Cerimônia de Olhares, ICA – Instituto
de Ciências da Arte, ao lado do teatro Waldemar Henrique e defronte ao suntuoso
Teatro da Paz. Reflito: por qual motivo este é o lugar escolhido, haja vista
que, este não é um teatro? Bom, não faz parte do meu metiê.
Adentro o referido
local, pego meu ingresso, sento ao lado de desconhecidos, cumprimento-os com
boa noite. Espero...
Por que comecei a
escrever isto? Ah, claro, porque já vi o espetáculo e sei que o mote do mesmo
é: Teatro de percepções! Por este motivo, o prólogo já começa neste intuito.
Nos 10 minutos do descer do coletivo até me alocar, quantas percepções minhas
retinas, olfato e audição puderam, neste pouco tempo, ficar gravados em minha
memória?
SENSORIAL – Se eu não
estivesse pensando sobre tudo o que ocorreu antes do ato teatral me indagar com
essa palavra destacada acima, tenho convicção, que todas essas ações até chegar
ao local do espetáculo passariam despercebidas. Assim como deixamos de
perceber, nestes tempos atribulados, o que se passa à nossa volta. Bom, este
espetáculo gerou de certa forma, o incremento de minha sensibilidade imagética.
Passaram-se 40 minutos
de espera, o diretor do espetáculo, Miguel Santa Brígida, nos cumprimenta e
fala brevemente sobre o espetáculo comemorativo dos 25 anos da Companhia de Atores Contemporâneos, da qual
é fundador, também cognominado “Teatro do Movimento” – O espetáculo faz uma
alusão a fragmentos de peças produzidas nestes referidos anos.
Adentramos o local
escuro da encenação, somos no máximo 30 espectadores. O espaço cênico de arena
não comporta muitos lugares. Fachos de luzes de lanternas perpassam pelo
recinto, apenas sapatos pelo chão negro e um piano compõe a visualidade. Atrás
das enormes janelas da grande sala, sombras dos atuantes intensificam nossas
expectativas.
Abrem-se as portas, as
iluminações compostas apenas de lanternas fazem um bailar de luzes sobre as
pernas dos atuantes como se fosse uma dança – Começa uma espécie de agitação
expressionista, ao qual me remeteu ao desenvolvimento de dança do teatrólogo
Rudolf Laban (1879-1958), ao qual o objetivo principal reside na expressão das
emoções baseado em quatro fatores: espaço, peso, tempo e fluxo. Nesta
perspectiva, os atores/performers
estabelecem com elegância e instintiva gestualidade, um aprazível, enérgico e
envolvente jogo dança/teatro, impulsionando, desta forma, uma trajetória de
cerimônia de olhares entre o sensorial onírico e a percepção imagético-sonora
dos elementos técnicos, da metáfora que nos é apresentada; completado pela
sintonia da sonorização (ao vivo ou digitais), gestos, dança, elementos cênicos
e a ruptura do textocentrismo ou dramatis
personae, características do Teatro pós dramático denominado pelo professor
alemão Hans-Thies Lehmann (1944) ao qual tenta reconstruir um diálogo com o
espectador:
Esta nova forma teatral não
procura suscitar a adesão do espectador, mas provocar sua percepção ou emoção
significativa. Os aspectos fragmentários destes textos, ou destas montagens,
permeiam uma reescritura cênica que englobam os aspectos textuais, cenográficos
e os problemas que são propostos por um jogo não necessariamente psicológico.
Nestes fragmentos de cenas que não têm, ao menos para mim,
uma linearidade, permanecem somente as sensações (que me foram intrínsecas): temor;
prazer; dor; morte; estupro; confiança; desconfiança; repúdio; loucura,
liberdade; nascimento dente outros – Nesta sinestesia, novos olhares são
possíveis no teatro contemporâneo. Tenho a sensação que somos parte inerente da
encenação, não necessariamente porque os performers
falam diretamente com o público, mas sim, por estarmos ligados pelas vivências
que nos transmitem esta teatralidade.
Para quem pretende ver Cerimônia de Olhares, sairá com a certeza que o teatro não
necessita necessariamente do “drama puro” para passar algo para quem o vê.
Pois, este espetáculo é uma espécie de simbiose que singulariza a sua
envolvência com a contemporaneidade, anestesiando quem o presencia.
São 22h13 min. Penso
nos três períodos de tempo existentes: o tempo passado, o tempo presente, e o
tempo futuro. Vem à mente a música Oração
ao tempo e, com esta canção, agradeço pelo belo espetáculo e dou votos de
mais 7x25 anos de “Teatro do Movimento”.
[...] Compositor
de destinos
Tambor de todos
os ritmos
Tempo, tempo,
tempo, tempo
Entro num acordo
contigo
Tempo, tempo,
tempo, tempo
[...] Por seres
tão inventivo
E pareceres
contínuo
Tempo, tempo,
tempo, tempo
És um dos deuses
mais lindos
Tempo, tempo,
tempo, tempo
[...] Portanto,
peço-te aquilo
E te ofereço
elogios
Tempo, tempo,
tempo, tempo
Nas rimas do meu
estilo
Tempo, tempo, tempo,
tempo
22h26min. Tirem suas
percepções sobre o espetáculo.
Continuo com a
sensibilidade aflorada.
Ficha
Técnica
Atuantes:
Alessandra Pinheiro, Aninha Moraes,
Cei Mello, Claudia Messeder, Edilene Rosa, Hudson dos Passos, Jaime Barradas,
Marcelo Nunes, Sônia Santos,.
Participações
especiais das bailarinas:
Ana Flávia Mendes Sapucahy,
Eleonora Leal e Waldete Brito.
Pianista
Convidada:
Mauri Ohana.
Equipe
Técnica:
Criação
roteiro:
Miguel Santa Brígida.
Assistente
de direção:
Jaime Barradas e Patrícia Passos
Pesquisa
musical:
Rogers Paes, Miguel Santa Brígida e
Marcio Souza.
Consultoria
Artística e Cenografia
Aníbal Pacha.
Figurinos
Direção e Elenco.
Desenhos
de Luz e operação
Direção e Elenco.
Operador
de Som
Marcio Souza
Costureira
Nadja Melo
Foto
Cartaz
Guy Veloso
Programação
visual
Raphael Andrade
Apoio Técnico e afetivo
Vitor Rezende, Lenni Torres e Vivi
Torres.
Produção
e divulgação
Patrícia Passos.
Direção
Geral
Miguel Santa Brígida.