Autora da Crítica:
Paula Adrianna Barros da Cruz – Discente do curso de Licenciatura Plena em
Teatro da Universidade Federal do Pará.
Estava no intervalo de
uma aula sentada com um colega de turma na lanchonete em frente ao Teatro
Cláudio Barradas, quando algo me despertou a curiosidade: uma fila de
aproximadamente trinta pessoas onde havia outras quinze ao redor vestidas de
preto que orientavam aos que estavam na fila a tirar os sapatos; logo após eram
vendados e organizados em grupos de quatro ou cinco pessoas. Não sabia que
teria espetáculo naquela noite, pois era bem atípico já que se tratava de uma
quarta-feira.
Acompanhamos a fila até
que não resistimos e decidimos “matar” a aula para assistir o espetáculo. Fomos
vendados. E primeiramente o sentido a ser despertado foi o tato: uma mão gelada
e delicada tocava a minha, logo não sabia mais qual o sentido era usado, pois o
vento batia em meu rosto, folhas que me pareciam ser de canela às vezes tocavam
meus braços, rosto e cabelo. Senti um frio gostoso em meu corpo e sabia que já
estava entrando no teatro, então pisava em folhas secas e uma voz cantava, e
sabia que era ao vivo; ao longo do espetáculo as sensações me traziam frescor e
bem-estar.
No entanto, apesar das
explosões de sensações e do despertamento do que em algumas vezes nem sabemos
que está lá como o tato, o olfato e a audição, algo me instigou a pensar o
espetáculo; logo percebi que se tratava de um teatro inclusivo, mas não porque
me vendaram e sim porque simplesmente era falado e discutido durante o espetáculo.
Penso que naquele momento não havia necessidade, pois por diversas vezes o
texto falado não me dizia nada, e se tornava excessivo, um reforço
desnecessário, ou como diria o professor Edson Fernando, se tornou um discurso
panfletário. A dramaturgia na linguagem teatral é um elemento fundamental, no
entanto é necessário saber trabalhar para que não ocorram exageros, nesse caso
a deficiência apareceu não nos olhos ou na cegueira, mas pela quantidade de
informações. A dramaturgia tratava do modo de ver as coisas, com que olhos
realmente enxergamos? Não sei bem mais do que falar sobre a dramaturgia, pois
em alguns momentos ela me passou despercebida devido às sensações, um dos
motivos pelo qual me posiciono da real necessidade desse discurso no espetáculo.
Outro apontamento que
desejo fazer, é sobre a voz dos atores, algumas vezes se utilizava o microfone,
e é importante saber usar este recurso, por vezes era gritado e não falado o
texto, porém não somente no microfone, mais também os atores sem ele quando não
gritavam, “rasgavam” a voz, e carregavam demais a interpretação na fala, tropeçavam
nas palavras, e como costumamos falar no teatro “metralhavam”. A fala como
principal meio de comunicação deve ser clara e bem articulada para que não haja
ruídos no canal de comunicação, e o risco é que a mensagem pode não chegar como
esperado ao receptor, principalmente quando o receptor está sem um dos
sentidos, nesse caso a visão.
Ao fim da apresentação
as vendas foram retiradas, e descobrir a visão novamente já meio turva devido
ter ficado um bom tempo com os olhos tapados. Descobri então o nome do
espetáculo: “Pelos olhos dela”, e o diretor e dramaturgo era Carlos Correia
Santos que trouxe para o palco do Teatro Cláudio Barradas sua pesquisa sobre
Teatro Inclusivo. Esta última informação soube no momento em que fui conversar
com ele para falar pessoalmente do que achei; ele tentara se justificar da
dramaturgia dizendo que nesse primeiro momento compreende o texto como
informativo e levar as pessoas a conhecer a deficiência e as discussões da
contemporaneidade.
Compreendo a
justificativa de Carlos Correia, no entanto, o teatro sendo uma linguagem de
gênero dramático e com todos os seus elementos extra verbais, reforço que tudo
que é trabalhado nesses elementos deve ser cuidadosamente estudado e avaliado
(não querendo dizer que isso não tenha ocorrido no espetáculo, apenas faço
menção para questionar a real deficiência que percebi na apresentação). Carlos
utiliza como elementos extras verbais os outros sentidos, o que já é
informativo principalmente para aqueles que estão acostumados a ter a visão, e
quando ele diz que deseja que as pessoas conheçam a deficiência ele já
apresenta para elas no espetáculo, então qual a real necessidade de se falar da
cegueira quando já não temos – provisoriamente – a visão?. Também é importante
apontar que informações têm em demasia nas redes sociais, jornais e programas
voltados para abordagem de temas sociais. O teatro é instigante, provocador e o
objetivo primeiro é o de mostrar. Seria realmente importante e relevante se o
espetáculo fosse totalmente sentido o que geraria um incômodo e traria o fio
instigador para uma reflexão mais crítica e então ao final houvesse uma
discussão sobre o que foi sentido e percebido e assim ele traria todo o seu
conhecimento e explanação sendo o intermediador de um diálogo.
Paula
Barros
06
de Novembro de 2015
Paula, li a crítica e, em nome do projeto, agradeço não somente a tua presença na plateia, como o interesse de escrever sobre a experiência. Nosso trabalho te inquietou, te provocou, te incomodou, te causou reações. E isso é maravilhoso! Teatro é tudo isso. Bjão!
ResponderExcluirCARLOS CORREIA SANTOS