Andrey Gomes: Aluno do
curso de extensão em crítica em teatro e dança-ETDUFPA
Resultado do Prêmio Myriam
Muniz/2014, o Dirigível Coletivo de Teatro concretiza o projeto “Migração Dirigível”
– turnê que contempla cinco regiões do país: Salvador (BA), Uberlândia (MG),
Florianópolis (SC), Brasília (DF) e Rio Branco (AC) e Belém, promovendo,
compartilhando, refletindo e fazendo o que eles sabem. E “O pequeno grande aviador e o planeta do invisível” é um bom exemplo
do que eles sabem: teatro híbrido (literatura, dança, música, vídeo e
artes plásticas) convergindo na possibilidade de linguagens; na verdade o
espetáculo é uma síntese desse arcabouço e da investigação estética proposta
pelo grupo.
Com atraso de meia
hora, aguardei impaciente o espetáculo em noite escaldante; o grito de guerra (merda!)
chamou atenção para o fundo do Casarão – vai começar a viagem. Viagem
prenunciada pelo magnífico caminho recoberto pelo verde que nos leva aos
holofotes do palco improvisado; simples aparência de uma cenografia lúdica onde
os atores discutiam entre si e pareciam aguardar o público – engano, o
espetáculo já começou.
Luciano Lira fez as
recomendações: “por favor desliguem o celular pois não queremos turbulência”.
Imediatamente os seis cubos metálicos transformaram-se em avião pilotado por
Maycon Douglas, ou melhor, pelo “aviador” corrompido pela vida adulta. A partir
daí estamos em algum lugar, ou lugar nenhum, só conhecido por quem se dispuser a
abandonar o racionalismo decano como propôs Exupéry em seu livro; sim, pois
embora seja adaptada, a encenação exige apelo ao faz-de-conta, em sintonia com
o livro.
Revezando o
protagonismo do pequeno príncipe, dentre os atores, Rodolpho Sanchez ficou com a maior parte das sequências, é com ele que
compartilhamos a angústia de não compreender a infelicidade das rosas – aliás,
uma única que nasceu em seu reino, que em vão ele cultiva e mima e diante disso
resolve trilhar o caminho das respostas. Para Piaget, a criança apreende o
mundo por um processo que implica pensar e agir sobre o mesmo, é nela que
podemos vislumbrar o mistério da construção do conhecimento.
Quando chega ao planeta
terra, nosso herói fica atônito com a quantidade e variedade de rosas, não
apenas gineceu e androceu, mas híbridas e indefinidas em situação complexa,
nesse caso a liberdade criativa da adaptação dialoga com o sex appeal contemporâneo, embora na obra literária exista esse
aspecto – o espetáculo atinge a esfera social. Há momentos de pura mímica, como
na sequência do aviador consertando seu veículo, e de improviso quando o
público é convidado a “atuar”. A banda musical que reveste com sonoridade a
narrativa, às vezes desafina (de propósito?) lembrando as apresentações
mambembes do nordeste; a iluminação na performance “das estrelas” tem seu ponto
alto; contudo, a jovem Ana Marceliano consegue equilíbrio dentre as
possibilidades cênicas .
O fazer teatral ao se
transformar num espaço de experimentação vale-se da tecnologia para minimizar
as limitações inerentes a esses espaços; em “O pequeno grande aviador” ela é mínima e encanta. A criança entra
por si só no mundo da representação, brinca, fazendo de conta – o que Freud
chamou de onipotência infantil é na verdade a crença de poder mover o mundo com
desejos, coisa que o Dirigível Coletivo conseguiu naquela noite, para adultos e
crianças.
08
de Outubro de 2015
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