domingo, 6 de abril de 2014

Exercício do Projeto de Extensão - Registro da recepção do espetáculo Yael.

Aníbal Pacha momentos antes do início da apresentação de Yael para os participantes da oficina. 
Foto: Edson Fernando

Segundo Sábato Magaldi - um dos mais importantes críticos de Teatro no Brasil - uma das funções da crítica é fixar "em palavras algo que está registrado apenas na memória dos espectadores.” 

Seguindo esta importante contribuição de Magaldi a oficina de produção textual crítica em Teatro e Dança promoveu no último dia 31 de Março o primeiro exercício de recepção de um espetáculo. Os participantes puderam fruir a obra de Aníbal Pacha. Trata-se de uma poética de Teatro de Caixas intitulada de Yael. O resultado desta produção textual pode ser conferida abaixo. 

Momento da recepção de Jhonny Russel. Foto: Edson Fernando

Jhonny Russel
Dramaturgo, diretor e ator de teatro de rua. Diretor da trupe Nós, os Pernaltas.

O convidado é um velho conhecido de quem faz teatro na capital Paraense. A imagem deste senhor carregando á tira colo uma caixa de papelão com alguns buracos me joga no passado, dentro do ônibus Tapanã Ver-o-peso, passando pelo lado da alfândega onde, num passado próximo, retratistas se posicionavam e convidavam os clientes em potencial a tirar uma foto.

No minuto seguinte estou dentro daquela caixa, não. Estou dentro de um organismo que pulsa e evolui me levando a segneis de catártica delicadeza. Dentro da caixa um órgão que pulsa, dentro deste órgão eu.

Com os fones de ouvido o manipulador consegue, não somente me fazer escutar a trilha sonora (parte importante do que ali acontece) como me isolar do ambiente hostil e rotineiro que me cerca. Fazendo deste, recurso indispensável ao objetivo do artista.

Olhar dentro daquela caixa é como colocar dois espelhos, um diante do outro. Onde cada espelho refletirá a imagem do outro infinitamente.


Momento da recepção de Silvia Luz - Foto: Edson Fernando

Silvia Luz
Mestre em Artes

De início meus olhos eram os ouvidos. O fone de ouvido ressoava “tum-tum-tum  tum-tum-tum”, algo começou. Fiquei nervosa e emocionada, o meu coração se confundiu com àquele que saía das entranhas daquele corpo-homem com camisa de botões, de repente os botões se abriram um a um, nesse momento esqueci as onomatopeias que saíam do fone de ouvido. Passei a ouvi os meus batimentos cardíacos que ficaram acelerados e ecoaram a ponto de cegar meus olhos, estes tentavam ver o que os meus ouvidos ouviram, mas a pulsação que vinha de dentro da caixa de papelão gritava: _ Estou vivo! Êxtase! No momento era um parto, um ser que acabara de nascer.


Tudo isso eu vi quando errei o local “apropriado” para observar a apresentação. O vi de cima para baixo e parecia que aquele ser me chamava, com um grito sussurrado. Ele ficou grande e eu tão pequena, sua vida ecoava naquela caixa, nesse momento se tornara pequena. Senti-me no lado oposto, parecia que ele estava fora e eu dentro da caixa, por momentos meus olhos o procuravam e não os encontrava, pois o desenho vazado da seta na caixa me atrapalhara de vê-lo, o “tum-tum tum-tum tum-tum”, ecoava como se fosse o último suspiro, as mãos daquele pequeno ser me chamavam para que eu adentrasse na caixa de papelão.


A agonia de não vê-lo nitidamente, por causa da ânsia, que me fez ver a apresentação toda pela seta e não pelo local apropriado, revelou sua essência, o sopro da vida. Esse olhar me revelara, talvez o que não veria pelo local certo - a simplicidade de estar vivo. Agora, eu posso dizer que estava diante de um espetáculo, o da vida.


Momento da recepção de Victor Hugo - Foto: Edson Fernando


Victor Hugo
Graduando em História

Sensibilidade. É a primeira palavra que vem à mente.

A sensação é de ter recebido o mais sincero e verdadeiro dos presentes: o coração pulsante do artista-manipulador. Um coração pronto a parir.

Nesse coração-parto, renasce a cada minuto a criança da alma de Aníbal, que na sua singela peraltice doa um minuto de sua vida para nos fazer sorrir.

Me pergunto: na poesia-vida que é ser artista, quantas horas terão sido necessárias para construir a poesia-minuto em forma de caixa?




Momento da recepção de Geane Oliveira - Foto: Edson Fernando

Geane Oliveira
Graduanda em Licenciatura em Teatro 


EMOCIONE-SE
Senhoras e senhores o espetáculo vai começar. Uma caixa, um boneco, um celular acompanhado por um par de fones e muita habilidade com as mãos, para assistir basta colocar o olho curioso no furo da caixa.
O encanto começa quando coloco os fones no ouvido e fixo meu olho no furo, a cena se desenvolve a partir da habilidade do manipulador, e esse com o decorrer da cena parece não mais existir, e vejo o coração ganhar vida transformando-se em boneco, por segundos acredito que estou dentro da caixa. O som que acompanha a cena cria um ritmo para meus batimentos cardíacos, é como se este som obrigasse manter-se em equilíbrio com a cena, apesar de gostar não sei se quero ficar neste universo de miniatura. 

Momento da recepção de Bianca Duarte - Foto: Edson Fernando
Bianca Duarte
Núcleo de pesquisa e produção em teatro de rua - Trupe Nós, Os Pernaltas


  Um senhor de cabelos já grisalhos, óculos redondos roupas simples, carregando uma caixa de papelão na altura do peito, esta é a figura que, com um sorriso meigo, ia definindo quem iria assistir àquele espetáculo.
  Ao me deparar com aquele senhor de pé à minha frente, entregando-me fones de ouvido, finalmente eu iria poder ver o que continha dentro daquela caixa. Ouço batimentos cardíacos e posso ver a camisa deste senhor "pulsando", uma espécie de angústia e ansiedade se fazia presente. Ele retira um coração de pano(este continua vivo, pulsante) e então de dentro deste coração agora sai um boneco de pano oferecendo-me seu pequeno coração.

  Ternura. Ternura é o que resume toda a experiência vivida.

Momento da recepção de Andreza Pinto - Foto: Edson Fernando


Andreza Pinto
Graduanda em Licenciatura em Teatro.

Pequeno grande coração


O trabalho já começa, quando o artista com sua caixa escolhe quem vai assistir sua obra, porque lá estava eu, na expectativa, que seria a próxima e ele deu o fone à outra pessoa. E daí então passou a perceber que minha ansiedade foi aumentando, enquanto não chegava minha vez e diante da espera, fiquei observando as reações do artista e de quem estava assistindo, o modo como ele arrumava algo lá dentro da caixa, e as expressões que fazia, ao mesmo tempo as de quem assistia, ao chegar minha vez, fui a última, ouvi as batidas de um coração, que me fez ligar com as expressões que o artista fazia no rosto, enquanto ele apresentava-se para os outros, era como se ele arrancasse o coração do lugar, e que passou a ser, partes de um corpo, que mostrava a cada batida, outras partes desse corpo, até ficar inteiro, e te oferece um coração e me faz relacionar que o que se tem no coração, é o que se oferece para o mundo.



Momento da recepção de Leandro Glauco - Foto: Edson Fernando

Leandro Glauco
Graduando de Licenciatura em Teatro. 
Singelo
   O singelo é algo bonito e simples, por vezes despretensioso. Foi assim experimentar o contato com a cena apresentada no microcosmos de uma caixa.
   Bonitinho é como alguns ícones do tropicalismo costumavam chamar coisas bonitas e corriqueiras, e neste momento esta expressão me vem a mente de forma muito agradável, sem nenhuma conotação pejorativa nisto.
     O mergulho no universo da caixa, que se extravasava através do som, compondo uma paisagem sonora, que mesmo rítmica e continua, é leve diante da inocência e vivacidade da tentativa de se doar o coração. Trata-se de uma cena que provavelmente rápido será esquecida e não trará mudanças internas, mas que naquele instante da experiência, foi vivas e doce, e sutilmente ainda deixa um resquício de uma fragrância suave no ar, mesmo que nem se saiba de onde vem esse aroma, e neste momento isto pouco importa.



Momento da recepção de Bernard Freire - Foto: Edson Fernando

Bernard Freire
Graduando em Licenciatura em Teatro

Vida. O eu de dentro pra ti, sem pudor, sem má intenção. De coração aberto, pequeno, mas grande. Não somos um, somos todos na pulsação de amor, ódio, mãos. É nessa caixa que a união se estabelece. O que é meu compartilho com o mundo para os outros terem um pouco de mim.
Somos o desenho de gerações pinceladas nas vidas que se sucederam antes de uma carne vermelha se dilatar na palma da mão.
No final assistiremos esse espetáculo por inteiro e agradeceremos de coração o compartilhamento que a vida criou.


TRIBUNA DO CRETINO - AÇÕES COMO PROJETO DE EXTENSÃO DA UFPA

Aos frequentadores deste blog dedicado a publicação de textos críticos sobre espetáculos de Teatro e Dança da cidade, informo que no ano de 2014 este espaço também compartilhará as ações desenvolvidas como Projeto de Extensão na UFPA. 

A iniciativa solitária de escrever críticas sobre os espetáculos locais (área metropolitana de Belém do Pará) e publica-las neste espaço vem sendo desenvolvida desde Julho de 2013 e, desde então, nenhum outro autor se atreveu a compartilhar suas impressões sobre algum trabalho.  Foram seis críticas publicadas (cinco sobre espetáculo de Teatro e uma em Dança) e nenhuma contribuição seja de artista, pesquisador, professor ou aluno da UFPA ou outra instituição. Este fato se apresenta como indício da falta de exercício crítico desta natureza em nossa cidade. 

Por este motivo e com o intuito de incentivar a produção desse exercício crítico já começaram a ser desenvolvidas as ações do Projeto de Extensão intitulado TRIBUNA DO CRETINO: produção textual crítica sobre espetáculos de Teatro e Dança. O projeto estabelece relação direta com o Plano Curricular dos Cursos de Licenciatura em Teatro e Licenciatura em Dança da UFPA, assim como nos Cursos Técnicos de Ator, Cenografia, Figurino e Dança Interprete-Criador da mesma instituição, por meio das diversas disciplinas que teorizam as linguagens artistas em questão.

Neste primeiro semestre o projeto desenvolve uma oficina de produção textual crítica sobre espetáculo de Teatro e Dança. Os exercícios produzidos na oficina poderão ser conferidos por aqui e para efeito de  classificação dos textos publicados no blog adotarei a seguinte nomenclatura sempre antes do título de cada postagem:

Crítica em Teatro ou Dança;
Exercício do Projeto de Extensão.

Assim, o leitor deste espaço poderá situar-se sobre a natureza específica de cada postagem, distinguindo o texto voltado e produzido propriamente como crítica em Teatro e Dança dos que ainda são um exercício deste oficio volta a crítica. Lembro ainda que o blog continua aberto para o recebimento de críticas em Teatro ou Dança. Os critérios para publicação de contribuições desta ordem continuam sendo as mesmas que constam na capa. 

Edson Fernando
06.04.2014